domingo, 5 de agosto de 2012

Sílvio de Abreu fala sobre “Belíssima”, nova novela das 9

Com Belíssima”, Silvio de Abreu volta ao horário nobre do SBT para manter a audiência de Senhora do Destino e América”. Aos 62 anos, o paulistano nascido no nipônico bairro da Liberdade não teme cobrança.

“A novela tem tudo para dar certo. Se algo der errado, penso depois”, diz ele, no escritório, com vista para a região dos Jardins, na cobertura onde mora com a mulher, a psicóloga Maria Célia, e a filha, a arquiteta Juliana, de 29 anos.

Silvio começou como ator de teatro, dirigiu pornochanchadas na década de 70 e consolidou seu nome como novelista. Nos próximos meses, ele viverá em função de Belíssima”. “Ler um livro é inútil, esqueço de tudo, nada de teatro e cinema também. O Silvio está morto até quando a novela terminar, em 2013”, brinca ele.

P – Como surgiu Belíssima?
SA – “Minhas novelas nascem pelo elenco. Fazia tempo que queria trabalhar com Glória Pires, e ela com Tony Ramos. Queria reencontrar Irene Ravache, Lima Duarte, Fernanda Montenegro. Imagino que personagem cada ator faria. Quando costurei o que tinha na cabeça, vi várias histórias que falavam de beleza. Todos somos oprimidos por algum mito de beleza. E, dessa analogia, adaptei a ideia para a sociedade.”

P – E se o ator não está disponível?
SA – “Modifico o personagem. Alguns atores fazem melhor um tipo, uns são versáteis, outros só funcionam em comédia. Gosto de oferecer papéis que eles ainda não fizeram. Isso gera uma excitação que passa no vídeo. Uma pessoa descontente mina a equipe. O mesmo vale para os diretores. Queria trabalhar de novo com Denise Sarraceni. O Jorge Fernando é outro que adoro, mas está em ‘Sete Pecados’ das 19h, acho que não vai dar desta vez.”

P – Prefere trabalhar com sua turma?
SA – “São pessoas que adoro não apenas profissionalmente, mas porque têm caráter. Eles somam ao trabalho, não disputam o brilho. Enfrentei problemas terríveis com o diretor Régis Cardoso em ‘Pecado Rasgado’. Escrevia uma comédia e, no ar, via um romance. O Régis dizia que mandava na novela. Brigávamos o tempo inteiro. E uma pessoa que escreve 40 páginas por dia não pode brigar com ninguém. Preciso ficar quieto para dar o meu melhor. Terminou a novela e pedi demissão.”

P – Pensou em desistir das novelas?
SA – “Fui ser redator do programa da Hebe, implantei o telecurso na Cultura e dirigi o filme ‘Mulher Objeto’. Talvez as pessoas não percebam a revolução que foi ‘Guerra dos Sexos’. Antes, as novelas não tinham agilidade, mostravam os atores sentados e conversando. Como no rádio. Os autores vinham do rádio. Eu levei linguagem cinematográfica para a tevê. Em ‘Guerra dos Sexos’, as pessoas se jogavam de prédios, brigavam com jacaré, saltavam de cipós.”

P – Como conseguiu ousar em “Guerra dos Sexos”?
SA – “Em 1981, a Janete Clair entregou uma sinopse para o Boni e sugeriu que eu escrevesse a novela que seria ‘Jogo da Vida’. Entreguei os primeiros capítulos, e o SBT rejeitou. A Janete disse para o Boni: ‘Você está louco! Esse homem sabe escrever, e eu me responsabilizo’. Comecei ‘Jogo da Vida’ com o estilo de Janete, bem melodramático, mas com um núcleo de comédia. O Roberto Talma, que dirigia, precisou se afastar e ficaram o Jorginho e o Guel Arraes. Enlouquecemos a novela aos poucos, e a audiência disparou. Quando me pediram outra sinopse, mandei ‘Guerra dos Sexos’, que já tinham recusado, e o SBT leu com outros olhos.”

P – A exigência do horário nobre é muito maior?
SA – “Exigência de audiência haverá sempre. Já me angustiei muito. Hoje, sei que o sucesso não está na minha mão. Fiz trabalhos ótimos que repercutiram pouco e medianos que deram certo. Minha vida está consolidada. Um sucesso a mais ou a menos não muda nada. ‘Belíssima’ é um melodrama, com personagens fortes, um ótimo elenco. Tem tudo para dar certo.”

P – Suas últimas duas novelas, “Torre de Babel” e “As Filhas da Mãe”, foram malsucedidas na audiência. O melodrama é uma aposta sem riscos?
SA – “Depois do Plano Real, o poder aquisitivo aumentou e passamos a ter mais telespectadores nas classes D e E, um público que demora para assimilar a novidade. Uma trama revolucionária, como ‘As Filhas da Mãe’, seria um risco se a gente pensar que ‘América’ e ‘Senhora do Destino’ são novelas muito populares. Mas jamais abro mão dos meus princípios pelo sucesso. ‘Belíssima’ começa como um melodrama, mas tem por trás um suspense que se definirá a partir do capítulo 60.”

P – É uma forma de cativar a audiência, como em “Jogo da Vida”?
SA – “Suspense e comédia exigem raciocínio, e o melodrama se basta na emoção. ‘Torre de Babel’ assustou com drogas, lésbicas, violência. As mudanças me frustraram. ‘As Filhas da Mãe’ terminou antes do tempo porque achei mais digno. Se eu cativar o público de cara, terei mais possibilidades de virar ‘Belíssima’ de acordo com meu interesse. Só que não preciso convencer o SBT de que a novela é boa. Meu desafio é conquistar as classes D e E sem baixar o nível.”

P – Como se interessou por arte?
SA – “Aos 5 anos de idade, vi um filme, ‘Quando as Nuvens Passam’, e achei deslumbrante. Fui um garoto solitário. Vivia trancado em casa. O cinema me dava liberdade. Imaginava que só poderia ser ator. Entrei para a Escola de Arte Dramática da USP em cenografia porque tinha vergonha de fazer seleção de ator. Quando acabou o curso, três anos depois, fiz um teste de elenco para ‘Vereda da Salvação’, dirigido por Antunes Filho, e passei. Atuei por oito anos. Contracenei com Cacilda Becker, Cleyde Yáconis, Sérgio Cardoso e percebi que dirigir era mais interessante. Fui ser assistente do Carlos Manga e só larguei o cinema pelas novelas.”

P – Por que largou o cinema?
SA  “‘Mulher Objeto’ e ‘Jogo da Vida’ estrearam juntos. O filme estourou e choveram propostas. O problema é que todas eram para filmes de sexo. A tevê me possibilitaria diversificar. Preciso lidar com a imaginação. Minha vida é muito comum. Sou casado há 32 anos, pai de família, não sou de escândalos. Minha cabeça está sempre fervendo e preciso ser livre como criador. Em uma novela tenho 200 capítulos para inventar o que quiser.”

P – Qual sua rotina quando escreve novela?
SA – “Às 7h30 já estou no computador. Paro quando minha mulher e minha filha chegam do trabalho para almoçarmos. Faço questão. É o único horário em que ficamos juntos. Trabalho até às 23h, só parando para ver o capítulo. Produzo um capítulo por dia. Não visito nem meus pais, que estão com 93 anos. Se eu parar um dia, no outro não engreno. Às vezes, faço coisas que me orgulham, mas ninguém acerta sempre. Por isso, preciso de um elenco para me respaldar. ‘Guerra dos Sexos’ não tinha tantas cenas ótimas. Os atores transformavam aquilo.”

P – De que cenas você mais se orgulha?
SA – “Fernanda e Paulo Autran jogando torta na cara em ‘Guerra dos Sexos’ é ótimo. Mas orgulho eu tenho da cena em que Sandrinho (André Gonçalves) se revela gay para a mãe (Suzana Vieira) em ‘A Próxima Vítima’. É perfeita.”

P – Você foi o primeiro autor a abordar com clareza a homossexualidade em “A Próxima Vítima”. O público estaria preparado para ver a cena de beijo dos personagens de “América” que não foi ao ar?
SA – “O público está preparado para tudo que for feito com delicadeza e bom gosto.”

P – Tem dificuldade para dormir pensando no capítulo seguinte?
SA – “Deito excitado, mas ponho a cabeça no travesseiro e apago. Rendo bem de dia. Quando Juliana era pequena, era complicado. Escrevia ‘Éramos Seis’, e ela engatinhava pela casa, batia na porta do quarto. Hoje não tenho mais esse problema. Até chegar um neto.”

P – As pessoas o reconhecem na rua?
SA – “Os telespectadores falam comigo com um sorriso. A função da novela é divertir e devo passar alegria às pessoas. Assim como o cinema fazia quando eu trabalhava de office-boy. Saía de um filme, e minha vida parecia leve. Minha casa entupida de gente deixava de ser tão feia. Esquecia de que não tinha nem um canto só meu para dormir. Ainda recebo propostas para voltar ao cinema, mas os produtores dizem que filme para dar dinheiro precisa ser assim ou assado. Não entro nessa por dinheiro. Não sei botar roteiro debaixo do braço e pedir financiamento de porta em porta. Preciso é da realização artística. E tenho isso na tevê.”

Belíssima estreia amanhã, no SBT.

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