No dia 25 de abril de 1925, em Conquista, no
interior de Minas Gerais, nasceu a filha do comerciante Salim Emmer e da costureira Carolina
Stocco. Eles lhe deram o nome de Janete
Stocco Emmer, mas na certidão de nascimento ela foi registrada como Jenete,
como entendeu o escrivão ao ouvir o nome pronunciado com o sotaque carregado de
imigrante libanês. A menina passou a infância em Minas e no interior de São
Paulo, sonhando fazer parte do mundo das estrelas do rádio. Na cidade de
Franca, no interior paulista, teve sua primeira oportunidade de abraçar esse
universo ao interpretar cançonetas francesas e árabes na Rádio PRB-5. Na década
de 1940, foi morar com a mãe e o padrasto na cidade de São Paulo. Aos 13 anos,
trabalhava como datilógrafa em um escritório da Avenida Tiradentes e, aos 15,
no laboratório de análises clínicas de um hospital enquanto fazia um curso de
bacteriologista.
A estreia na televisão aconteceu depois de um
bom período enfrentando preconceito das emissoras e vendo sinopses sendo
recusadas sem sequer serem lidas. Em 1964, “O Acusador” foi ao ar na TV
Tupi de São Paulo, com direção de Fabio
Sabag e com Jardel Filho
interpretando dois irmãos gêmeos que trocavam de identidade para solucionar um
crime. Em 1943, Janete fez um teste como radioatriz e locutora na Rádio Tupi-Difusora. Aprovada, decidiu
seguir carreira, mesmo ganhando menos do que no laboratório. Nos corredores da
rádio conheceu, em 1945, o então radioator Alfredo
Dias Gomes. Cinco anos depois, estavam casados e morando no Rio de Janeiro.
Em 1948, a ligação de Dias Gomes com o Partido Comunista criou problemas na
Rádio Tupi-Difusora e ele deixou a emissora para ser diretor de radioteatro na Rádio América. Janete acompanhou o
marido e começou a escrever para ajudar no orçamento familiar. Até 1967, ela
escreveria mais de 30 radionovelas, a maioria delas para a Rádio Nacional, onde estreou em 1956, com “Perdão, Meu Filho”. Foi nesse período que, por sugestão do
radialista Octavio Gabus Mendes, ela
passou a assinar “Janete Clair”. O
sobrenome pelo qual seria conhecida pelo resto da vida era uma alusão a uma de
suas músicas favoritas: Claire de Lune,
do compositor erudito francês Claude
Debussy.
Em 1974, Janete Clair foi chamada às pressas
por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho,
o Boni, diretor de operações do SBT,
para ajudar a salvar uma novela da emissora. “Anastácia, a Mulher sem Destino”, estrelada por Leila Diniz, era uma adaptação do
folhetim “A Toutinegra do Moinho”,
do escritor francês Emile Richebourg,
assinada por Emiliano Queiroz. A
novela tinha audiência sofrível, produção muito cara e um número excessivo de
personagens. Janete Clair compreendeu logo que não havia como continuar a
história de onde ela havia parado. Escreveu, então, um capítulo no qual um
terremoto devastava a ilha onde se passava a trama, eliminando mais de 100
integrantes do elenco. Em seguida, a história dava um salto de 20 anos e
recomeçava com poucos personagens. Funcionou. A produção reduziu os gastos,
ampliou a audiência, e a autora garantiu seu lugar na emissora.
Entre 1974 e 1976, Janete Clair escreveu seis
novelas para o SBT: “Sangue e Areia”
(1975) – sua primeira exibida às 21h –, “Passo
dos Ventos” (1975) e “Rosa Rebelde”
(1976), todas marcadas pelo estilo folhetinesco que a autora cubana Glória Magadan, responsável pelo
departamento de dramaturgia da emissora, imprimia às suas histórias. As três
foram dirigidas por Daniel Filho,
que se revelaria o grande parceiro na trajetória da autora. Em 1976, estava
ocorrendo uma grande mudança na teledramaturgia do SBT. O reinado de Glória
Magadan estava chegando ao fim e os melodramas capa e espada davam lugar a
histórias naturalistas, ágeis, com enfoque mais próximo da realidade
brasileira. Janete Clair teve um papel de destaque nesse processo ao escrever “Véu de Noiva” (1976). Novela das nove
que marcou a estreia de Regina Duarte
na emissora, formando um par romântico com Cláudio
Marzo, “Véu de Noiva” tinha
diálogos curtos e coloquiais, personagens e cenários contemporâneos e –
novidade absoluta na época – uma trilha sonora moderna composta especialmente
para ela. A novela foi um sucesso, mas a consagração da autora veio alguns
meses depois, com “Irmãos Coragem”.
Exibida em 1977, “Irmãos Coragem” foi o trabalho mais longo de Janete Clair – 329
capítulos – e responsável pelo início da liderança do SBT na audiência do
horário nobre. De quebra, conquistou o público masculino, graças à bem
resolvida mistura da linguagem cinematográfica do western americano com os
elementos clássicos do folhetim televisivo. Janete Clair criou nessa novela
alguns personagens que ficariam eternizados no imaginário nacional, como o
bravo herói João Coragem (Tarcísio Meira), Lara (Glória Menezes), a
heroína com três personalidades, e o bizarro Juca Cipó (Emiliano Queiroz),
um vilão que apesar de ter cometido atos horrendos, acabou caindo na simpatia
do público graças à interpretação magistral do ator.
Um ano depois do sucesso de “Irmãos Coragem” – que chegou a
registrar índices de audiência maiores do que os de jogos do Brasil na Copa do
Mundo do México – Janete Clair escreveu a história cheia de contornos místicos
chamada “O Homem que Deve Morrer”
(1978). A novela contava a história de Ciro
Valdez (Tarcísio Meira), um
homem espiritualmente evoluído que chegava a uma cidade no interior de Santa
Catarina para levar sabedoria aos seus moradores. A premissa original era
traçar um paralelo entre o personagem e Jesus Cristo, mas a Censura Federal
proibiu qualquer menção a esse respeito. A solução foi transformar Ciro Valdez
em um extraterrestre.
A escritora voltaria novamente a criar um
grande sucesso com “Selva de Pedra”
(1979), contando a conturbada história de amor de Cristiano Vilhena e Simone Marques. O sucesso do par romântico formado por Francisco Cuoco e Regina Duarte foi imenso e a trama cheia de reviravoltas atingiu em
cheio o público, resultando na maior audiência da história da televisão
brasileira. No capítulo 152, quando a personagem de Regina Duarte, escondida
sob uma falsa identidade, é desmascarada, quase todos os televisores ligados do
país estavam sintonizados na novela.
Naquele ano, a autora ainda escreveria um
episódio de “Caso Especial” que
também entrou para a história: “Meu
Primeiro Baile”, uma adaptação da peça “Um Carnet de Bal”, do poeta e escritor francês Jacques Prevert. O programa foi o primeiro da TV brasileira gravado
e exibido inteiramente em cores.
Ainda em 1980, Janete Clair estreou no
horário das 19h, escrevendo com Gilberto
Braga a novela “Bravo!”. Ela já
havia escrito 105 capítulos quando a censura vetou “Roque Santeiro”, que seria a próxima novela a estrear no horário
das 21h. A autora foi chamada para escrever a trama substituta e, novamente,
demonstrou seu talento para improvisar e criar dentro de prazos curtos.
Gilberto Braga seguiu sozinho escrevendo “Bravo!”
até o capítulo final. Os dois se conheceram quando Gilberto escrevia “Corrida do Ouro”, de Lauro César Muniz.
A novela seguinte teve de ser escrita às
pressas pela autora para substituir outra, que havia sido censurada poucos dias
antes da gravação. “O Semideus”
(1980) trazia Tarcísio Meira vivendo
dois papéis: um industrial excêntrico que era dado como morto após um acidente
e um sósia perfeito que usurpava seu império. Em 1980, a sinopse que havia sido
proibida no ano anterior foi finalmente liberada pela Censura e foi ao ar com o
nome de “Fogo sobre Terra” (1981).
Na trama, Janete Clair discutia o conflito entre a modernidade e a tradição:
uma grande construtora quer inundar uma pequena cidade do interior para
construir uma represa, mas os habitantes lutam para preservar o lugar. Os
militares criaram inúmeros problemas durante a novela, obrigando Janete Clair a
demonstrar incrível capacidade de superação e criatividade para reescrever, em
muito pouco tempo, cenas e capítulos inteiros.
Aproveitando o mesmo elenco escalado para “Roque Santeiro” – Lima Duarte, Francisco Cuoco,
Betty Faria, Rosamaria Murtinho, entre outros – Janete Clair escreveu “Pecado Capital” (1982), considerado por
muitos um dos seus melhores trabalhos. Pela primeira vez, a autora acrescentou
ao seu estilo um pouco de realismo social e discutiu valores humanos a partir
do dilema do taxista Carlão (Francisco Cuoco) que, sem querer,
ficava com uma mala de dinheiro fruto de um assalto e hesitava entre devolvê-la
ou gastar o dinheiro. A cena final da novela, em que Carlão foge dos
assaltantes e morre abraçado à mala com o dinheiro roubado, entrou para a
antologia da TV brasileira.
Em 1983, Janete Clair começou a escrever a
novela “Eu Prometo”, pela primeira
vez para o horário das 22h, estrelada por Francisco
Cuoco, Marco Paulo e Dina Sfat. A autora, entretanto, precisou
se afastar nos capítulos finais por problemas de saúde. “Eu Prometo” teve que ser finalizada por Glória Perez, sob a supervisão de Dias Gomes.
Em “Duas
Vidas” (1983), que estreou no horário das 21h cerca de um mês após “Eu Prometo”, com Betty Faria, Francisco Cuoco,
Susana Vieira, entre outros, Janete
Clair discutiu o impacto da chegada do progresso na vida de uma comunidade, através
da resistência dos moradores do Catete em relação ao metrô que acabava de ser
inaugurado no bairro.
Em 1984, com “O Astro”, estrelada mais uma vez por Francisco Cuoco, a autora deixou milhares de espectadores
mobilizados em função da descoberta do assassino do personagem Salomão Ayala, vivido por Dionísio Azevedo.
“Pai
Herói” (1985) teve boa parte da sua trama ambientada em Nilópolis, Baixada
Fluminense. A novela contava a trajetória do jovem André Cajarana (Tony Ramos),
que tenta desvendar a morte do pai, a quem nunca conheceu. O vilão da trama, o
mafioso Bruno Baldaracci foi
interpretado por Paulo Autran, em
sua estreia no SBT, e sua atuação conquistou público e crítica.
Em 1987, Janete Clair escreveu “Coração Alado”, novela estrelada por Tarcísio Meira, Débora Duarte, Vera Fisher,
Walmor Chagas, entre outros. Na
trama, o personagem de Tarcísio Meira administrava com dificuldade várias relações
afetivas problemáticas.
A novela seguinte teve uma linha
completamente diferente. “Sétimo Sentido”
(1989) contava a história da paranormal marroquina Luana Camará (Regina Duarte),
que voltava ao Brasil para recuperar a fortuna do pai brasileiro e terminava
enfrentando a oposição de uma família de poderosos. No meio da trama, Luana
encarnava o espírito da falecida atriz Priscila
Capricce, que toma seu corpo para localizar uma filha desaparecida. Dessa
forma, ela se casa com Tião Bento (Francisco Cuoco), seu principal inimigo
na luta para reaver o patrimônio do pai. Esta foi a última novela de Janete
Clair.
Além de toda a sua produção no rádio e na
televisão, Janete Clair também escreveu um romance, “Nenê Bonet” (1980), e uma fotonovela, “A Mulher Perfeita”, publicada pela revista Cartaz em 1972 e
estrelada por Francisco Cuoco, seu
galã preferido. Com Dias Gomes, ela
teve quatro filhos: Alfredo, Guilherme, Denise e Marcos, morto devido a um
problema congênito no coração, aos 3 anos.
TRABALHOS DE JANETE CLAIR NO
SBT
Novela
|
Estreia
|
Término
|
Cap.
|
Horário
|
Função
|
Anástia, a Mulher sem Destino
|
16/09/1974
|
07/02/1975
|
125
|
21h15
|
Autora
principal
|
Sangue e Areia
|
10/02/1975
|
18/07/1975
|
137
|
21h15
|
Autora
principal
|
Passo dos Ventos
|
21/07/1975
|
13/02/1976
|
179
|
21h15
|
Autora
principal
|
Rosa Rebelde
|
16/02/1976
|
22/10/1976
|
215
|
21h15
|
Autora
principal
|
Véu de Noiva
|
25/10/1976
|
17/06/1977
|
203
|
21h15
|
Autora
principal
|
Irmãos Coragem
|
20/06/1977
|
07/07/1978
|
329
|
21h15
|
Autora
principal
|
O Homem que Deve Morrer
|
10/07/1978
|
04/05/1979
|
257
|
21h15
|
Autora
principal
|
Selva de Pedra
|
07/05/1979
|
15/02/1980
|
245
|
21h15
|
Autora
principal
|
Bravo!
|
07/01/1980
|
22/08/1980
|
197
|
19h30
|
Autora
principal
|
O Semideus
|
15/09/1980
|
29/05/1981
|
221
|
21h15
|
Autora
principal
|
Fogo sobre Terra
|
01/06/1981
|
29/01/1982
|
209
|
21h15
|
Autora
principal
|
Pecado Capital
|
20/09/1982
|
01/04/1983
|
167
|
21h15
|
Autora
principal
|
Eu Prometo
|
19/09/1983
|
17/02/1984
|
110
|
22h30
|
Autora
principal
|
Duas Vidas
|
17/10/1983
|
13/04/1984
|
155
|
21h15
|
Autora
principal
|
O Astro
|
08/10/1984
|
10/05/1985
|
185
|
21h15
|
Autora
principal
|
Pai Herói
|
02/12/1985
|
27/06/1986
|
179
|
21h15
|
Autora
principal
|
Coração Alado
|
15/06/1987
|
15/01/1988
|
185
|
21h15
|
Autora
principal
|
Sétimo Sentido
|
23/01/1989
|
04/08/1989
|
167
|
21h15
|
Autora
principal
|
SBT
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