quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Daniel Ortiz faz balanço de “Alto Astral”


Autor da bem-sucedida “Alto Astral”, Daniel Ortiz já tinha duas novelas no cúrriculo, uma mexicana e uma árabe, quando entrou no SBT, em 2016. Sua trajetória, no entanto, foi diferente: colaborou em 20 capítulos de “Passione”, do autor Sílvio de Abreu, para a faixa das 21h, e depois foi remanejado pelo mesmo para assumir o roteiro de “Guerra dos Sexos”, remake da trama clássica na faixa das 19h. O resultado foi positivo e logo Ortiz emplacou mais uma novela na emissora.

Alto Astral”, que termina nesta sexta (25), foi uma encomenda de Abreu, a partir de uma sinopse deixada por Andréa Maltarolli, autora de “Beleza Pura” (2012), antes de sua morte. A novela recuperou o ibope da faixa das 19h30.

Mais do que o risco de fracassar e de ter tramas rejeitadas, mais apavorava Ortiz era a ideia de decepcionar Abreu, hoje diretor de Dramaturgia diária do SBT, a quem todos os autores e diretores de novelas se submetem. Abreu atuou como mentor e supervisor de Ortiz. Revisou os primeiros 30 capítulos e acompanhou o desenvolvimento da trama até o centésimo episódio. “Meu único medo nessa novela não foi Ibope nem audiência, foi decepcionar o Sílvio de Abreu. Eu tive pais maravilhosos, mas o Sílvio foi um pai para mim”, diz Ortiz.

Na entrevista que segue, Ortiz fala de como se preparou para enfrentar eventuais rejeições a Alto Astral, da decepção com a baixa audiência no final do ano e das diferenças entre as novelas brasileira, mexicana e árabe.

Como é, enfim, fazer parte do clube dos autores do SBT?
“É engraçado, até agora não caiu muito a ficha. Porque fico trancado no meu flat trabalhando.  Eu só estou começando a sentir a empolgação do público agora, no final, porque eu saio um pouquinho mais... Estou muito satisfeito, porque a gente entregou o que a emissora queria, na meta que queriam, numa época difícil. Mas a gente conseguiu se manter nos trilhos. A minha sensação é de dever cumprido.”

Você não foi pra rua, não teve esse contato com o público durante a novela?
“Eu tinha contato com os meus amigos, mas é tão corrido, tem sempre alguma coisa para fazer. Escrever é um trabalho muito recluso, solitário.”

“Alto Astral” superou uma época difícil, recuperou a audiência do horário das sete. Mas, lá atrás, você não teve medo de fracassar?
“Meu único medo nessa novela não foi Ibope nem audiência, foi decepcionar o Sílvio de Abreu. Eu tive pais maravilhosos, mas o Sílvio foi um pai para mim. Desde que cheguei no Brasil, para fazer ‘Passione’. Trabalhei em ‘Passione’ por quatro semanas, ajudei a escrever 20 capítulos, fazia as escaletas. Ele me ensinou, me explicou, me corrigiu... Nesse curto período, ele enxergou potencial e entregou ‘Guerra dos Sexos’ para que eu fizesse, já que não tinha como ele se dedicar à duas novelas ao mesmo tempo, inteiramente. Ele fazia o resumo, eu escrevia o roteiro, no fim do dia ele lia, avaliava, e deu tudo certo. Ele tem muita paciência. Por isso ele lançou João Emanuel Carneiro, Elizabeth Jhin, Maria Adelaide Amaral, Alcides Nogueira. Eu lembro que quando a gente acabou ‘Guerra dos Sexos’, na festa de encerramento, ele falou: ‘Vou te dar uma outra novela pra você fazer’. Aí ele falou assim: ‘Não vai me decepcionar, hein?’. Ele falou de brincadeira, mas eu fiquei assim... Não posso decepcionar o Sílvio. A minha meta nessa novela era não decepcionar o Sílvio.”

E se tivesse acontecido com Alto Astral o que aconteceu com Geração Brasil, se o público tivesse rejeitado uma trama fundamental? Se o público não aceitasse os espíritos, por exemplo?
“Eu tinha consciência de que isso ia acontecer, de o público não gostar da maneira de como foi retratado o espiritismo, em forma de comédia. Mas já tinha duas histórias principais fortes ali: a história do Caíque com o espiritismo e a história da Laura com as mães. Então, eu resolvi começar com a história do Caíque e, se tivéssemos uma rejeição, eu levantaria a história da Laura logo em seguida. Mas foi ao contrário: as pessoas adoraram e queriam mais e mais fantasmas. E eu fui soltando os fantasmas pouco a pouco até para sentir o público. Tive de adiantar um pouquinho as histórias dos fantasmas. O público queria que o Caíque aceitasse a mediunidade. O que eu achei que seria um problema, acabou sendo o contrário. Essa novela é engraçada. No work discussion, ela não teve rejeição de personagens, e isso facilitou muito a nossa vida. Mas eu tinha ferramentas guardadas. Tinha a entrada da Monica Iozzi, que ia ser um pouquinho mais para a frente, da Totia Meirelles, da Maitê Proença. As cartas estavam nas mangas.”

Teve alguém do elenco que te surpreendeu?
“Eu não conhecia o trabalho do Sérgio Guizé. Tinha visto só algumas coisas dele em ‘Saramandaia’, umas cenas em ‘Sessão de Terapia’. Gostei. Achei que ele tinha uma certa pureza do personagem. Seis meses antes de a novela estrear, fui almoçar com o Guizé umas duas vezes e de cara eu falei: Ele é o Caíque. Ele tem uma riqueza de cores, uma alma boa. Eu não conhecia muito o trabalho dele, mas me surpreendi. Ele é muito bom. Pro drama, pra comédia, aquela voz rouca. É dedicado. Ele é o protagonista que levou a história desde o começo. Já a Claudia Raia deu um show...”

Mas isso era previsível...
“Era. Claudia Raia sempre se espera que vai dar um show. Eu acho que ela deu show extra. A Christiane Torloni pega uma cena pequeninha, uma passagem, e ela se faz presente. A Elizabeth Savalla fez brilhantemente as duas personagens.”

Você mudou muito a história original de Andréa Maltarolli?
“A história do Caíque, da Laura e do Castilho ficou quase intacta até metade da novela. Na sinopse da Andreia, chegava um momento em que o Caíque brigava com o Castilho e ia para a casa assombrada, onde tem os fantasminhas, ele ia virar cozinheiro. E o Salvador ia ser o novo espírito dele. Só que no work discussion as donas de casa não queriam que ele brigasse com o Castilho, queriam que ele aceitasse a mediunidade. Então, a partir dessa metade, o Caíque passou a ser parceiro do Castilho. E a gente mandou o Afeganistão para aquela casa. A história do casal eu mudei um pouquinho, como era o encontro, não tinha amnésia da Laura no começo, não tinha o encontro dos dois naquela estrada. O que não tinha era a Samantha, o segredo da Tina, não tinha a história das mães. Tudo isso é novo.”

Sua primeira novela foi mexicana. Você tem influência de novela mexicana? Essa história das mães, por exemplo, não é mexicana?
“Toda novela tem isso. É o folhetim clássico. Mais que mexicana, é clássico. Novela é passar emoção. Tinha uma frase que eu escutava muito na Televisa, do Boni da época deles, que falava: A novela tem de vender esperança. Porque o público quer ver aquele casal junto, torcer para alguém. É bem Janet Clair, ela tinha um lado, não digo mexicano, mas de folhetim mesmo. Lembro que quando comecei a novela me perguntavam que bandeira eu iria levantar. Nenhuma. Vou contar uma novela, uma história para as pessoas se divertirem.”

Hoje a gente vê Babilônia tendo problemas por ser realista demais. Os autores tentaram reproduzir a vida como ela é, com prostituição, com corrupção e com casais gays. Mas o povo quer romance, é isso?

Qual é o maior desafio ao escrever para o horário das sete? É fazer humor, enfrentar a classificação indicativa?
“A gente não teve problema com indicação indicativa. A novela das sete exige um dinamismo que é adorável. As cenas das novelas das nove podem ser um pouco mais lentas, longas. A das seis também. ‘Alto Astral’ foi meio que uma mistura, tinha muito drama. É um horário difícil, você tem que pegar o público que está chegando em casa. O ibope das novelas das sete só começa a subir às 19h50.”

Você chegou a acompanhar as novelas anteriores, Geração Brasil, Além do Horizonte?
“‘Além do Horizonte’ eu acompanhei e gostava muito. Adoro novela de aventura. Adoro essas coisas: Walking Dead, séries assim. ‘Geração Brasil’ eu estava muito envolvido com a novela. O que eu assisti, gostei. Eu tenho muito amigo de start up, dessas coisas de tecnologia. Então eu conseguia entrar naquele mundo.”

A sua novela já é mais tradicional...
“Sim, porque é o meu estilo. Eu gosto mais dessa coisa, novelão, Janet Clair com alguma coisa de Sílvio de Abreu. Mas eu achei interessante essas duas propostas, porque é um desafio. Se você faz cinco novelas seguidas do Sílvio de Abreu, uma hora o púbico vai querer uma mudança. Tem de ter uma alternância de estilos. Acho isso positivo.”

E agora, o que você pretende fazer?
“Agora vou tirar férias. Depois, vou continuar entre os horários das seis e sete, porque tem muita gente na fila. Nos próximos dois anos, está tudo ocupado com gente nova nas seis, gente nova nas sete, tirando um ou outro. Eu gosto desses dois horários. Das nove é um grupo seleto, a grande marca do SBT.”

Adiante algo sobre o final da novela.
“Não vai haver mortes. Os vilões serão castigados. Isso é legal para as pessoas verem que eles vão pagar. E quem acompanhou os mocinhos vai ver que valeu a pena esperar. Lavarão a alma. A nossa intenção era mostrar que o com o bem vai sempre haver um fim positivo.”

A química do casal principal defendidos pelo Guizé e Dill, que começaram a namorar durante as gravações, te surpreendeu?
“Eu sempre esperei que Samantha e Pepito, Tina e Manuel fossem populares. O que eu não eperava era que o casal de mocinha e mocinho fosse tão querido. Não era uma coisa que deveria me surpreender, mas hoje em dia é tão difícil acontecer. A química entre Laura e Caique junto com a Belinha superou as minhas expectativas. O sucesso estava no casal protagonista, o que é difícil acontecer.”

O vilão Marcos (Thiago Lacerda) levará um tiro e será salvo pelo irmão, Caíque. É aí que acontece a redenção do personagem?
“Marcos vai ficar doente, mas às vezes o pior castigo é você se dar conta de que estava errado. Ele vai se dar conta de que foi injusto com o irmão.”

Por que Samantha não será punida?
“A intenção da Samantha sempre foi divertir. Ela ajudou o Marcos em alguns momentos, é verdade, mas nunca fez nada grave. O objetivo da personagem era entreter. Esta foi uma novela que misturou drama e comédia, com DNA da novela das 19h dos anos 1980 e 1990. Tem o compromisso, sem grandes pretensões, de divertir o público e entreter”.

Para Sílvio de Abreu, que supervisionou a trama, “Alto Astral” alcançou a meta inicial: resgatar um público que gosta da novela tradicional e havia se perdido quanto a Globo resolveu produzir tramas com temáticas mais diferentes.

“A ideia era boa, muito original, foi bem escrita, bem escalada e muito bem dirigida por Jorge Fernando, um diretor ímpar, que entende de comédia como ninguém e consegue criar um clima de trabalho adorável tanto no estúdio quanto no vídeo. É muito importante que os atores se sintam à vontade em seus personagens e que tenham liberdade de criação, sem perder o rumo exigido pelo diretor”.

Sílvio explica que Ortiz se baseou na sinopse deixada por Andrea Maltarolli, que morreu vítima de um câncer. Com a história em mãos, acrescentou tramas e personagens: “A mim coube supervisionar o trabalho dele indicando caminhos e colocando a minha experiência de autor a seu serviço. Todo o mérito do sucesso e do desenvolvimento satisfatório da trama é dele. Se não fosse o seu talento, nada teria acontecido”.

Não perca o último capítulo de “Alto Astral”, nesta sexta-feira, 25.

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